domingo, 24 de outubro de 2010

Eu gosto de me perder por ai...

Desde criança eu sou meio atirado, não exatamente destemido, porque não consigo ser tão bobo,soa até um tanto poético,mas a minha natureza me leva a querer ir a lugares aonde os outros não vão e ver coisas que outras pessoas não vêem.Durante a minha infância eu dei alguns perdidos e certamente preocupei minha mãe, mas eram outros tempos nos quais as crianças do meu bairro brincavam na rua desde a manhã até a noite sem ter que se preocupar com a maldade que andasse lá fora.
Durante a adolesecência não foi diferente, mas surgiu então uma paixão pela vida noturna. Olhando para trás só consigo agradecer a D´us por me trazer para casa ileso depois de tantas incursões ao Bexiga e outras regiões da cidade tão frequentadas por bicho-grilos, punks e aborrescentes que não tinham nada de melhor para fazer na vida.Não me esquecendo que na grande maioria das vezes voltava para casa de madrugada nos cata-loucos da CMTC que passavam nas imediações da Praça Ramos e paravam na Rua Guaicurus...
Um dia a aviação entrou na minha vida e junto com ela vieram as viagens para onde minhas aspirações e as viagens a trabalho pudessem me levar...e eu não perdi a mania...continuei querendo me perder.Conheci as principais cidades da Europa desse jeito, Nova York também foi assim.Me embrenhei por ruas e vielas que não estavam mencionadas em guias.Isso não quer dizer que não conheci os principais pontos turísticos, mas tive a grande oportunidade de ver como os nativos vivem, onde e como comem, onde compram suas roupas e víveres e até como se entretem e como reagem a questões cotidianas como um guarda multando um carro, um assalto ou uma batida de carros.Não consigo me imaginar viajando para conhecer um lugar sem pensar em me perder, com a ressalva de que não sou louco de fazer isso à noite, nem de consultar algum nativo sobre alguma região que ofereça risco.Eu recomendo a qualquer um que faça isso algum dia, mesmo que seja aqui em São Paulo.Mas porque raios resolvi escrever isso?
Sinais de senilidade somadas a uma crença imbecil de colocar à prova uma engenhoca via satélite me fizeram zanzar quase meia hora à pé pelas ruas da Vila Madalena, entre a Rua Natingui e a Av. Heitor Penteado em busca da casa de um amigo e chegar na casa dele completamente morto de tanto subir ladeiras e com a camisa completamente encharcada de suor.Eu fiz a besteira de querer tomar um atalho por uma escadaria e dai me lembrei que tinha um navagador via satélite com mapa no meu celular...ele até me localizou, mas não entende nada de ensinar caminhos, nem de resgatar retardados, que como eu de vez em quando resolvem se perder. Só consegui me encontrar depois de ligar para o amigo e olhar em volta para me situar.Meu senso de direção ainda não foi superado.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Ração humana

Outro dia desses escrevi sobre universos paralelos, e mencionei mundos com os quais não estou familiarizado.
À princípio a ficção científica descreve um universo paralelo como um mundo ao contrário e acho que esse conceito se aplica mais a este post do que ao outro, vejam só.
Segundo o dicionário Houaiss ração pode ser difinida como:
1.Quantidade de alimento calculada para o consumo diário ou para cada refeição de um indivíduo
2.Porção de víveres distribuída racionadamente (p.ex., a soldado, a presidiário etc.)
3. Porção de alimento (grão, palha etc.) que se dá a um animal diariamente.
Das três definições a que me soa mais familiar é a terceira..alimentação para animais...para ser mais familiar ainda ração para cães e gatos.Comida para passarinho eram as chamadas misturas e a vitamina amarela...esses termos eram usados por um amigo de infância que criava canários.
Notem que não acho que as outras definições estejam incorretas, mas como nunca fui preso nem fui soldado não as considero usuais. A maioria dos pobres mortais ao ouvir falar de ração certamente pensarão em um grande saco de Bonzo...os mais novos pensaram em Pedigree Champ ou congêneres.Mas nove entre dez pessoas não pensará em sua própria alimentação.
Enfim, vamos ao ponto.
Agora há pouco eu falei do bom e velho Bonzo.Por um acaso essa ração que estava até há pouco tempo fora de fabricação encheu os bandulhos dos meus totós por muito tempo.
Bonzo foi lançada no Brasil no final dos anos 70 e me lembro da preocupação do fabricante em transmitir ao consumidor a idéia de que o seu totó comeria algo muitíssimo nutritivo e com um sabor de carne tão intenso que o cão não se daria por conta de que estaria comendo ração indus-trializada. Notem que o publicitário agiu como se estivesse vendendo ração para consumidores exigentes, verdadeiros gourmets de paladar sofisticadíssimo.
Esse apelo foi tão forte que eu duvido que exista algum cachorrista que não tenha provado bonzo para sentir qual era o gosto.Eu fui um deles.Experimentei a ração seca e umidecida. Notem ainda que pasteleiros oportunistas se aproveitando dessa crença criaram na época o famosíssimo pastel de Bonzo, que chegou a virar notícia escandalosa nos periódicos da época.
Não bastando ainda esse apelo, ainda hoje sou capaz de cantar o jingle do Bonzo Fígado, cuja letra foi adaptada à uma das árias da ópera o Barbeiro de Sevilha..."Bonzo fígado, bravo, bravíssimo é novidade para agradar, saborosíssimo , saborossímo todo cachorro vai adorar..."
Eu considero a campanha do Bonzo um case de sucesso...e não devo ser o único.
Hoje, em pleno ano de 2010, 30 anos depois de uma campanha dessas, em plena era da Slow food, da dieta mediterrânea, em um momento que se pode dizer que o gosto pela boa mesa está se popularizando como nunca me aparece uma anta querendo vender um troço chamado RAÇÃO HUMANA??
Eu sei que vivemos também a era de alimentos funcionais, multivitamínicos shakes, fibras granolas e outras coisas.Em meio a toda essa parafernália provavelmente deve haver bastante coisa bem saudável. Mas o saudável e o nutritivo na minha infância sempre teve gosto horrível e isso não deve ter mudado.
A tal ração humana pode até ser a coisa mais saudável do mundo, mas vem cá, em um momento como esse tem gente querendo me convencer a comer um troço com esse nome?
Do jeito que o trabalho tem absorvido meu tempo e minha vida, uma oferta como essas me faz sentir como um verdadeiro animal de carga movido a fardo de ...RAÇÃO e remontou um outro momento da adolescência.
Esporadicamente eu tinha que ir a um escritório que se localizava na rua Álvaro de Carvalho, no centro da cidade.Essa rua é uma travessa da Rua Martins Fontes e ali além da sede do DCI (antigo Diário do Comércio e Indústria) havia ainda um pequeno botequim que servia refeições a preços populares. O proprietário na onda das siglas apelidou carinhosamente o estabelecimento de CRE, que queria dizer Centro Reabastecedor Estomacal. Impossível não estabelecer uma relação....eu devo ter atravessado algum espelho e estou em algum universo paralelo.... Socorro!!!!!!